quinta-feira, 9 de abril de 2015

coisa nenhuma (ou nada outra vez)

Amor
não sei a razão
porquê Amar-te
não sei porque não
mas devo-te a verdade
não devo negar-te
o carinho
com que nunca faltaste

Amor
não sei o que quer dizer
tenho a minha maldição
sinto só o que é dos outros
nada em mim
Não posso fechar os olhos
porque dentro
não há nada para ver
tenho que ficar sempre acordado
para não sentir a dor
de coisa nenhuma

(E) hoje que te olho
como tu olhas o mundo
acho-me ainda mais perverso

afagar de cabelos
suspiros, cantos, ais
devo merecê-los
mesmo que nunca mais

foras tu como todos
e acabar o amor seria só isso
mas és tu,
és
afagar de cabelos,
suspiros
és todos os sorrisos e
consegues tê-los
todos num espreguiçar matinal

És o bem,
sem erros.

Jeito (ou nada)

O jeito perdeu-se
deixou de saber o caminho de casa
como se as pernas perdessem o r
e ficassem penas
que juntas fizessem asas
e o às duplo das asas
que antes era mão ganhadora
deixasse de ser sequer um
e passasse a ser bisca seca
de um naipe que não o de trunfo

a facilidade com que fazia tudo
fez o homem pensar-se maior do que era
fez até os outros julgarem-no enorme
e,
se o era
era-o porque era, não porque o julgassem assim
ele e os outros

houve um dia
(como há sempre)
em que levou com a realidade
ficou deprimido
e
por isso
a realidade, com que tinha levado, deixou de ser
passou a ser menos
porque se achava menos
e quanto menos se achava, menos era

Estava sempre pessimista
e por isso tinha sempre razão quando achava que não era bom
e quanto menos bom era mais razão tinha em achar-se mau
e mais mau ficava
e quando péssimo já não tinha superlatividade suficiente para definir

levou outra vez com a realidade
e descobriu que era o que era
não pior que isso
por isso julgou-se bom
ficou contente e achou que isso era bom
há tanto tempo que a Alegria não vinha...
mas veio, sem razão especial
começou a achar-se bom
e com jeito
por isso conseguia fazer tudo
e bem feito
o coração já não estava mudo
apeticia-lhe abraçar
sem razão, só para partilhar
partilhou, partilhou, partilhou
até que se partiu
e em vez de ficar triste
continuou alegre
sem razão
o médico disse que ele era desiquilibrado
ele disse ao médico que era feliz
o médico disse que isso passava...
...e passou

ficou cansado
e farto por não mandar em si mesmo
foi à ponte da cidade e
depois de tomar uma caixa inteira de calmantes
e cortar os pulsos
atirou-se lá de cima
ficou quase um mês a cair
quando finalmente chegou ao chão
estava todo partido
costelas, braços, pernas
no hospital disseram que teve muita sorte em acordar do coma
ele continuou a achar que teve falta de jeito
mas em vez de deprimir, riu-se
riu-se tanto que acabou em pranto
saiu do hospital
e foi viver,
como toda a gente!

sábado, 4 de abril de 2015

Nada

Para quê juntar nuvens e formar tempestades, sempre que tudo está perfeito?
Porquê deitar abaixo o castelo de cartas, quando falta uma só para ficar feito?
será por medo, ou obsessão,
será por falta de vontade ou apenas de um coração?

Sei que não minto quando digo amar-te,
Mas sinto culpa se me dizes o mesmo.
Dizes que preferes assim: ter-me quando é possível,
e deixar-nos apenas quando tiver que ser.

Tenho que respeitar-te e aceitar que é como dizes,
mas sei que tens esperança que eu não queira partir de nós.
Sei que acreditas que podemos ser para sempre,
é por isso que me sinto traidora quando me confessas o teu amor,
é por isso que sinto um sufoco quando me te entregas tanto.

Vânia, Fevereiro 2008